Senti hoje algo que ao longo dos anos é inevitável de vez em quando sentir, que as recordações, apesar de não serem apagadas, podem ser desmanteladas.
Há lugares, pessoas, edifícios, árvores, praias, enfim uma infinidade de “marcos” que nos transportam a mente para tempos idos, que sabem bem quando os voltamos a ver, que fazem parte de nós. Que por vezes numa simples partilha de memórias nos abrem o sorriso de forma rasgada, nos fazem sentir as emoções e aromas como se nesse preciso momento tivéssemos sido transportados no tempo.
Neste caso em particular refiro-me a um pontão, a uma amontoado de madeira, ferro e pedra. Algo básico não tivesse ele sido parte integrante do crescimento, palco de momentos gravados na história, pelo menos na minha. Poucos conseguirão imaginar (provavelmente só mesmo quem conheceu esses tempos) a animação que se vivia nesses anos por lá, em que muitos da “trupe” (alguns que na altura nem se conheciam) passavam os seus dias por aquelas bandas, em que aquele era “o” sítio, por muito ridículo que isso possa agora parecer.
Era ali que se davam os primeiros grandes mergulhos, que se punham à prova as habilidades que se aprendiam noutros lados, que se faziam os primeiros ensaios românticos de ver o Sol a pôr-se, que se aprendia a alegria de conviver com os amigos junto ao mar (mais exactamente num rio com vestígios de sal).
Quando as drogas pesadas faziam vitimas entre os mais velhos e os pais alertavam os mais novos dos seus malefícios, descobríamos que independentemente da “ameaça” haviam ainda assim pessoas válidas, que marcavam mensagens nos mais novos, fazendo perceber que aquilo era um mau caminho, como os próprios diziam. Nos tempos em que éramos 3 miúdos que iam “andar de skate pró Rosário, as pessoas falam do carocho que tá lá mas ele no fundo é porreiro”, isso já nos fazia crescer como seres humanos, percebendo que aparte de crenças, raça, estrato social ou mesmo rótulo (naquele caso devido a vício) a “capa” não passava exactamente disso mesmo. Tudo isso enquanto íamos olhando para o pontão, acompanhando a maré até estar no ponto certo para a diversão aquática.
O crescer percebendo que tal como na vida tudo se transpunha, tal como na fase em que somente aqueles que tinham braços mais compridos conseguiam passar o portão de ferro, para anos mais tarde constatar que isso era agora bem fácil, o perceber que “éramos mesmo pequenos naquela altura”. Conceber o sonho de um dia ter a Califórnia a poucos kms de casa, de tal como lá poder surfar por entre os pilares quando algum maremoto decidisse invadir a praia. Sorrir ao recordar aquele Sol na face.
Muitos momentos mágicos se registaram ao longo dos anos por aqueles lados desde então, muitos amigo(a)s olharam o outro lado da margem, muitas gargalhadas foram soltas naquele lado da margem, muitas conversas se teve por ali. Conversas que em nenhum consultório se conseguiria abordar. E ele ali imóvel, de madeira, ferro e pedra, sempre presente, por muito simples que fosse.
Sou defensor de que tudo na vida faz parte, tentando sempre encarar de uma forma positiva aquilo que se viveu, que nos fez ser como somos. Por isso mesmo quando as “recordações” desvanecem, o que impera é alegria e não tristeza porque são no extremo sinal de algo que já vivi, como se de uma embalagem de imagens e emoções se tratasse, que só eu (e vocês) tive e mais ninguém terá, por mais que eu o queira partilhar.
O pontão pode ter sido desmantelado. Mas na minha mente, sempre estará por lá. Pelo menos até o Alzheimer fazer das suas. :)
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
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2 comentários:
Acreditas q tenho saudades de ter pacotes de bolachas de H2O & NaCl :oD e garrafas de água na bagageira?!
Relembram-me os momentos de nonsense, as conversas, a partilha de vontades, receios, desejos, em suma, tudo o que tu tão bem expressaste no post e mais um bocadinho! :)
Nhaca, nhaca, nhaca, tubarões, crocodile dundee, é o q te digo!! :)
Recordações, são marcas na nossa vida!
Podem os lugares mudar de cenário, podem as personagens deixar de existir, mas continuarão inevitavelmente "dentro" de nós.
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